Uma ex-artista que ainda é apaixonada por sua ex (e eventualmente pode ter recaídas), meio ciborgue, completamente transgênera e um pouco cansada (do mundo em geral). Geralmente dormindo. Quando acordada pode ser vista por aí andando de bicicleta na volta da uergs (onde voltou a ser estudante), ou tomando um café em alguma das dezenas de cafeterias que conhece em porto alegre ou andando por aí sonhando acordada com um mundo sem relógios.
Boas ideias e pouca organização
Remix na roda é um mix gigante da história, sonhos, empolgação e desejos de um homem negro que descobre o mundo, a dança e a si mesmo nos anos 1980’s em Porto Alegre.
Marco Rodrigues tem carisma e consegue cativar o público ao longo do trabalho, trazendo vários recortes de sua própria trajetória na dança, sua formação a partir da cultura da época e o como isso trouxe auto descobrimentos e conquistas com o tempo.
Marco sabe dançar variados estilos de dança, jogar capoeira, é ginasta, organiza bailes, e também dança coladinho. São esses alguns dos momentos trazidos à cena nos recortes de Remix.
Várias ideias que em geral não são bem aproveitadas.
Falta cuidado na composição de cena, no ritmo e na direção de cena.
Muita fala, muito processo, muita ideia, muita energia, muito vídeo, muito silêncio, muita coisa, muita.
E muita coisa precisava de mais azeite entre as coisas, transições, alternação de ritmos, de intensidades.
Meus dois centavos:
- Sobre falas em espetáculos de dança: Me parece que em trabalhos de dança alguns bailarinos(ou diretores, ou coreógrafos, ou… ) se preocupam mais com a coreografia do momento dançado, corpo em dança do que com o corpo parado que fala, o corpo-voz, a entonação, a flutuação e a forma como as palavras também podem dançar na cena, e, nesse sentido quando espetáculos usam bastante a voz e o texto pelos bailarinos sai sem preparo isso mina o próprio trabalho.
Esse trabalho poderia ter tido um melhor trabalho de texto, voz e roteiro para seguir a proposta e ter uma potência maior; ou, cortar fora o texto.
Não nos expliquem o que vocês vão fazer a seguir ou o que acabaram de fazer, nos mostrem.
…
Outra coisa, momentos breves de dança em duo do Marco com Natália Nunes são alguns dos momentos de brilho de cena, o que me faz questionar porque ela não é creditada como bailarina na ficha técnica, e também, porque não aprofundaram mais no duo ao longo da apresentação; flui bem a química de cena entre os dois.
Apesar dos incômodos que eu trouxe, não posso dizer que não gostei do espetáculo.
Como eu disse antes, Marco tem carisma, cativa o público, nos trouxe para participar da cena, nos trouxe para dentro da sua história, dança bem, tem ideias criativas que fazem que o conceito da apresentação desperte interesse. Abu Ewls veio muito bem como DJ na cena, os tubos de luz azuis e vermelhos na busca por caracterizar os anos 80 pela luz funcionam e por último mas não menos importante a paixão que a memória e a dança do passado (anos 80’s) ainda despertam nos bailarinos (e em nós do público) no presente (dos nossos anos 20’s) é muita coisa.
Peça com cheiro.
Partindo daquela ideia de ritual e de cuidado.
Sinto que a dicotomia entre cuidado e o descuidado são os pontos que o roteiro melhor busca trabalhar, e sendo assim todos os elementos trabalham para isso, desde o cheiro aos elementos cênicos, a música ao vivo, figurino, luz e mulheres da cena.
Mulheres,
as pessoas que são forjadas para lidar com cuidados e descuidados da vida.
Intensidade,
Uma apresentação que busca repetidamente envolver o público com sentimentos das suas personagens em cena.
Mães, filhas, esposas, ex, apaixonadas, acorrentadas, livres…
Eu quero voar.
Um pouquinho de contexto:
A peça é uma homenagem do diretor Paulo Guimarães à sua mãe Terezinha Jardim Machado, que além de homenageada é também assídua espectadora do belo trabalho que seu filho criou. Na apresentação temos histórias de Terezinha e de Terezinhas, vemos no palco mulheres de várias idades trazendo um pouco do que é ser e viver mulher na nossa sociedade, com seus prazeres e suas dores.
Um pouquinho de parênteses:
Já assisti Terezinha algumas vezes, também por ser fã de uma das atrizes, minha professora Marga.
(
Margareth Leyser é bailarina, fisioterapeuta e professora de aulas de grupo de cadeias musculares e articulares, aulas que tenho o prazer de participar eventualmente desde 2020. Seu trabalho é transformador em várias camadas imagináveis que se pode pensar da palavra transformação. Em especial no alívio de dores e melhorias de qualidade de vida das suas alunas (todas, das mais velhas às mais jovens) e sua pessoa é um misto de potência, vigor, humor (as alunas ajudam nisso também) e muito muito afeto.
)
Uma das coisas que destaco a nível pessoal é perceber a mudança que vejo na Marga professora para a Marga bailarina em Teresinhas, a começar pela cena “Eu quero voar”, pra mim o ponto mais interessante é ver como Marga consegue fisicamente se por num local de fragilidade em cena que eu particularmente nunca vi antes, é algo que me toca.
Entrega física e emocional são fatores que não faltam em cena. Importante para mim destacar nesse quesito as cenas do casamento que funciona muito bem com a música ao vivo, os movimentos mais contidos e a energia concentrada no fundo do olho das bailarinas e outra cena de duo que retrata relação conturbada entre mulheres(creio que de gerações diferentes) em que a raiva e o afeto brigam por espaço e a dificuldade da escuta cria os conflitos.
Na última apresentação que assisti a bailarina Chana Manica conseguiu me fazer sentir como se eu e ela tivéssemos começado um relacionamento, posteriormente nos casado e nos divorciado, e tudo isso no final por culpa minha que dilacerava o coração dela - fui a pessoa do público escolhida nessas trocas de olhares cúmplices. - e… desculpa por ter partido seu coração Chana - não foi minha intenção, acho. E… parabéns por isso, eu de fato me senti envolvida pela cena.
…Me pergunto se tínhamos filhos ou pets e quem será que ficou com a guarda?
A música e voz ao vivo que veio muito bem na participação de Tiago Rinaldi. Considero tão boa a música ao vivo inclusive que momentos de áudios de auto-falantes destoam e muitas vezes não fluem tão bem quanto.
Um pouquinho de “woke”:
Não gostei dos textos de Vinicius de Moraes num geral… talvez(será?) eu seja ‘woke’ mas alguns dos textos considero machistas, e, no contexto desta apresentação e roteiro me fazem sentir que não combinam com algumas das cenas.
Quero trazer também minha visão sobre os textos falados pelas bailarinas - na maioria das situações não funcionaram e, é perceptível que por vezes o próprio texto pode desestabilizar algumas das bailarinas ou mesmo a ânsia de dar o texto acelera momentos rituais que estavam se desenvolvendo bem sem precisar de falas. No meu ver, a exceção a essa crítica se dá na cena do meio da apresentação em parece que as frases e a voz ajudam a conduzir o movimento e orquestram bem a cena, lembro da frase “o cabelo queimou” (acho que era essa). É um momento que os textos estão bem alinhados, bailarinas estão com segurança, mesmo que falando ao mesmo tempo se escutam bem em cena, o público ri, o texto compõe com o corpo em cena e faz sentido no todo da cena.
Gosto das coreografias, gosto dos elementos cênicos, da luz e do cenário - toda a composição te transporta para um local onde essas mulheres vivem e trazem um calor intimismo do público com a cena.
Nury Salazar:
Vale por último dizer que Nury Salazar, uma das bailarinas do espetáculo, que morreu ano passado e não estava nas últimas apresentações, é insubstituível. Sinto que a dança de Porto Alegre sentirá sua falta, e que ela ainda possui uma grande contribuição em Teresinhas mesmo sem estar presente fisicamente.
Parabéns Bárbara Spessato, Chana Mânica, Fernanda Stein, Flávia Bernardes, Gabriela Rutkoski e Marga pelas performances potentes.
Eu também quero voar. E assistir mais vezes o trabalho de vocês.
Dança em 3 atos e + uma história.
Trabalho, dor, transcendência e uma comunidade.
Assim vejo o trabalho de Luciana Caetano, bailarina goiana que trouxe a sua vida para o palco e movimentou os solos gaúchos com a densidade e a fluidez de seus movimentos. Repetições constantes e controladas, domínios de expressões corporais e faciais, alternância entre movimentos, alternância entre personas num só corpo, religião, pratos de comida embalados se dividem no espaço de cena e compõe junto com a bailarina a história.
Ato 2: dor. Incrível como a ausência de movimentos, as mudanças no figurino, e voz em cena podem fazer para criar nova atmosfera e uma quebra de momento (poucas pessoas classificariam como um ato pois é bem mais curto do que toda primeira parte de cena, mas pra mim é um curto e forte momento da cena), vemos a fragilidade e o cansaço da bailarina, da vida laboral, da mulher. Eu gosto desses momentos depressivos de cena, me faz sentir menos só no mundo, poder compartilhar das dores que vemos nos outros e na arte…
A bailarina volta para a finalização com um novo figurino, uma saia branca, mais suave, rodante, temos movimentos mais fortes, catárticos. É quase como se fosse uma borboleta nascendo. Cores e potência, transformação.
Um dos pontos que achei que não funcionou tão bem foi a projeção de vídeo durante a apresentação, desviava um pouco o foco do momento presente, porém entendo a busca por mostrar a correlação da dança com o dia dia e a necessidade de trazer para o palco a casa concreta.
Casa.
Adobe.
Família.
Trabalho.
Vida.
Dança.
O final com a contação de histórias é muito belo - chamar o público para comer os pratos representativos de seus familiares (ops, creio que estou dando muitos spoilers… acontece né…). É interessante perceber que sim, eu estava certa de que haviam personas diversas na performance(yey). Essa foi uma homenagem gostosa à família da artista, do dia-dia do seu arredor, onde cresceu, o que comiam, particularidades, carinhos em formatos gastronômicos (é bom que é carinho e enche a barriga junto)...
E assim foi, um suspiro.
É um show ou uma peça?
Dança espetáculo
Cyberpunk, fumaça, apocalíptico, afogado, transfigurador.
Não
faz
senti_
do
.
Me surpreendi um bom dum bocado. Tá aí uma coisa que eu não imaginava ver a companhia municipal criando, não imaginava ver espetáculo assim em porto alegre, que potência e que destruição. Poucas coisas que vi assim na vida. Adoro.
… Talvez meu ponto de vista não fosse o melhor, estava no lado esquerdo da cena, sentada na grama crescida, perto das grades, olhando embasbacada todo aquele cenário: canhões de iluminação, figurinos, bailarinos… A Paula Finn, achei que ela ia cair daqueles barris/tambores de metal… (talvez fosse o melhor dos pontos de vistas também, no meio da ‘floresta’ que rodeia o estacionamento do apocalipse)
As pessoas transeuntes do lado de fora da grade(que deviam (olha eu supondo o que as pessoas deviam estar fazendo) estar indo para casa) pararam para ver o trabalho, estando ainda mais fora do melhor ângulo de vista do que eu. Percebi que muitos dos que pararam ficaram até o final também.
Embasbacados.
(apresentem mais vezes, essa cidade carece de assistir o coração encharcado de vocês)
O grotesco e o poético unidos na dor e no caos. Uma tradução da nossa realidade rio grandense afetada pelas águas deste ano, da dor e da impossibilidade.
Não saber o que fazer, a dança não-dança junto com a dança-dança em momentos - O entrecortado era bem forte nos movimentos, falas no microfone, uso dos objetos cênicos, mas o fluido também estava lá presente, como a água(para o bem ou para o mal).
O plástico, que escolha legal o plástico como elemento cênico, bailarinas andando por cima dele, o prédio coberto por ele, bailarinas dentro dele, a água no plástico, a luz no plástico, o excesso e a falta d’água, o asfalto, os diversos níveis de cena utilizados, primeiro plano, plano médio e plano de fundo dando profundidades que um palco italiano não permitiria.
Um show de excessos.
Falando em excessos, de novo a bailarina numa dança-relação abusiva, dando uma ansiedade em mim(e talvez na plateia também)de que ela caísse e arrebentasse a cabeça no asfalto do estacionamento do teatro renascença. Socorro.
Perigos nos conflitos.
Um grande controle físico de todos em cena e bastante transpiração.
O sujo e o feio, com alguns respiros de poesia e beleza e vontade de transformação.
As falas cortadas dos bailarinos, o grunge do som, o atordoamento… Acho que estou sendo repetitiva…
Trabalho foda da companhia. Retrato de uma Porto Alegre de hoje e de amanhã,
e ainda assim…
Essa eu vi hoje ainda, bem fresquinha na memória, e, que me perdoem as outras - foi a que mais gostei das três.
Me lembrei porque eu gosto tanto de dança e bateu num lugarzinho pessoal e momentâneo também porque estou num momento de fragilidade física depois de ter tido uma crise de lombalgia após meses mais estressantes e ter descoberto uma hérnia de disco na coluna. (tristeza né).
Dança não precisa ter milhões de twists e piruetas e imposição física para ser incrível. Dança é movimento, é composição, é troca, é tônus, é desejo, sensação, vontade, afeto, sincronia. Tudo isso e mais um pouco tiveram os novos velhos corpos 50+.
A luz estava perfeita, com os seus momentos mais suaves e mais quentes, a música ao vivo em sincronia com a dança traz um sabor próprio e gostoso (é um espetáculo de dança E de música), os vídeos estavam perfeitos e a videodança compôs muito bem a cena junto aos bailarinos no palco, os bailarinos tinham química, tinham tônus, tinham trocas nas brincadeiras, nos carinhos, no tesão, na maca, no chão, no vídeo. Eu ri, me emocionei e senti um calorzinho no peito, sabe?!
Química.
É isso, amei as coreografias e as composições de imagens, som e trocas entre atores.
Eu vi ao lado da minha colega de oficina de crítica expandida, a Clarissa Brittes, e em alguns momentos afetuosos de cena na dança eu também acompanhei afetos dela com sua filha que por fim dormiu durante o espetáculo, acho que isso também trouxe outro sabor para a vivência num geral.
Ahh, tenho que falar da Eva Schul em cena também. Que bailarina!
Roubou o spotlight quando estava em cena, consegue trazer o olhar do público para si. Um dos nossos maiores ícones de dança do estado e muito potente no palco.
Adorei a cena pós trocas de roupas, e a dança que veio depois que deu uma energia “jovem”, colorida, vibrante.
Corpos de dança.
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Talvez possam dizer que estou ‘puxando a sardinha’ por aqui, pois já fiz muitas aulas de dança com Eva que atuou em Novos velhos corpos e com Airton que dirigiu Coração encharcado e por isso de tantos elogios, e pode ser isso mesmo. Sou tendenciosa.